quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Série Pretinhas do Leite: A Menina da Feira


Olha o moi de quentro um real, folhas? Bode, galinha ou peru? Em meio a tantas ofertas, tantos barulhos, lama, gente, multidão havia uma garotinha de unhas de florzinhas, blusão rosa, vestido de preguinha e um jeito doce de menina mulher. Chegando perto notei que ela descascava cebolas ao som de um radinho que tocava rock love, panteras ou algo do tipo.

 Quem passasse por seu estande ou não notaria aquela presença meiga disputando com tanta informação pulsante ou não imaginaria que Patricia Ferreira dos Santos de 20 anos é mãe de família, dona de casa e casada.

Para aquela pretinha do leite a vida começou cedo. Após concluir os estudos e fazer um curso de informática, veio a gravidez, Patrícia ficou diante da necessidade de aumentar a sua renda, seu companheiro frentista não daria conta de tudo. A primeira ação foi distribuir currículos na expectativa de conseguir um trabalho, sem muitas possibilidades foi convidada por sua prima para trabalhar na feira de São Joaquim, desde então não faz outra coisa a não ser dar grande parte do seu tempo à venda de verduras e legumes.

É com uma renda de em média um salário mínimo que ela compra o que deseja, paga contas, ajuda na criação de seu filho e ainda sobra para manter a vaidade. Mas não é fácil, Patricia trabalha de segunda a domingo, das seis da manhã as seis da noite com uma folga a cada quinze dias, já presenciou mortes e assaltos dentro da Feira de São Joaquim. Quem pensa que ela se importa está muito enganado, na maior parte do tempo Patricia rir e se diverte, vê seu trabalho como uma terapia, uma forma de não ficar parada em casa, de ocupar seu tempo e ter uma renda.

Quando foi questionada sobre seu maior sonho, respondeu sem pestanejar: “ser enfermeira”. Patricia está há uma semana fazendo um curso de enfermagem, após o termino pretende fazer faculdade também na área de saúde e seguir carreira. Para seu filho ela não espera diferente: “Vou incentivar ele a estudar, quando crescer ele que vai dizer o que quer ser, não posso dizer o que quero, mas estou aqui para apoiar no que for.”

Patricia continuou descascando cebolas com seu jeito de pretinha do leite, em silêncio contrita em seus pensamentos. Na cabeça? Ideia, projeto e desejos de uma menina mulher preta, feirante e futura enfermeira.

5 comentários:

  1. Gostei, Janaína. Texto com estilo, simples, direto e com poesia. Parabéns!

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  2. Negra, negrinha, negona ou nigrinha. Assim são chamadas nossas negras do leite, que quando novinhas de sainha curta, um estilo de cabelo destes lançados pelas mídias, por uma mulher que um estilista arrumou e caiu no gosto de todas, e por isso estão assim. Passeiam bonitas, rebolando o que suas culturas não lhe ensinou a usar de forma errada ou certa. Até que chega o dia em que a pretinha, no ápice do do seu desejo de se tornar mulher: - Se "perde" com quem não preta! Esta vai ser a afirmação de sua mãe ao saber que engravidou, após cinco meses de gestação. Mas a a neguinha agora está ali. Linda, arrumada e satisfeita. Não depende de quase ninguém, trabalha e mesmo com dificuldade, sustenta o dela, "o quem não preta" está do lado dela e a esperança de que vai melhorar está ao seu alcance. Ô negra retada! Parabéns Mia!

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  3. Lindo perfil, gostei muito. Parabéns pela iniciativa do Nêga do Leite. Sucesso \o/

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  4. Gostei sim, tenho de concordar com Laércio, a poesia do texto me fez viajar..

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  5. Ótimo texto: desprendido e criativo.
    Ótima série Pretinhas do leite...
    É sempre interessante, entre tantas personalidades, poder contar um pouco da vida de uma pessoa. Recortar um pedacinho de uma feira, ou de qualquer lugar, através da história dessas pessoas.
    Parabéns!!!

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